Porto 22 graus

21.3.11
porto 22 graus
à espera da mala

o corpo não queria ainda voltar
agarra-se pela ponta dos dedos

é refrescante sair
largar a rotina;
regresso aos poucos
agarrada a uma certa apatia

a pressão ao descer, na cabeça, nariz... os milésimos de segundo de "queda livre" e a senhora do lado que agarra a perna do marido a cada solavanco.

as palavras atropelam-se na cabeça
e os dedos não sabem bem o que escrever
e a mala que não vem e me dá mais uns momentos fora da minha realidade
já rola o tapete
e cá estou
está calor
e a electricidade estática estala-me nas mãos quando tiro o casaco
(please take off your jacket ó cara de estrangeira; mérci e áurrevuár)

acabei de ler o Livro
e vejo tudo ligado
o emigra francês do Livro, os franceses no avião que não param de parlê
a sensação de clareza de encaixe de todas as peças
mesmo aquelas que pareciam não pertencer a este puzzle
embriagada de sono,
deixo vaguear o pensamento
para não ter de estar já aqui
de volta à vidinha
só mais um pedaceinho...
absorvo pronúncias, gestos, risos, formas de falar
reproduzo-os inconscientemente
e as palavras que me saem pelos dedos são como as do Livro
misturadas no tempo e no espaço
e agradeço ao autor, assim como ele agradece ao leitor
a claridade
a nesga de luz que se abriu e libertou tantas palavras

o céu aqui está mais azul e o mar também
ao contrário do que esperava.
fomos almoçar à beira-mar
aproveitar este sol

abrir a mala
sentir os cheiros
especiarias, broinhas
diluente, detergente
depois de uns dias entupidos, os cheiros invadem-me as narinas

estou numa luta contra o sono
escrever e escrever antes de acordar
antes de esquecer
antes de acordar aqui e já não ser lá
e depois já não saber exactamente as mesmas palavras
e perdê-las da memória

é bom sair
é preciso mudar o ponto de vista
é preciso dançar e dar saltinhos e dar abraços a um copo de vinho
é preciso ser ridícula e rir e fazer parvoíces
é preciso dar, fazer, partilhar
fazer…
ser útil
é preciso jogar e ganhar e perder e ter muita sorte, ou ter muitos duques
e rir de tudo isso e do que mais vier

voltar de coração cheio
e de mãos com tinta, demãos de tinta.. e pingos de tinta nos sapatos
e pingos de leite na bica: sai mais um garoto enquanto rabisco nas toalhas de papel do café
e bebo um chá e vamos ao Sá, ou bebo uma brisa maracujá; ice tea é que não pode ser!
e uma broinha que vem sempre a calhar
e um prego especial e saio a rebolar
… também há muita humidade nesta “ila” da Madeira…

e sentir-me tão em casa que só apetece dizer até já

4 comentários:

Luísa Freixo disse...

até já!<3

Anónimo disse...

o corpo chegou ao lado de cá, mas alma ainda ficou7está lá......
é bonito.
beijos
olides

Marta Figueroa disse...

e a alma não precisa de bilhete de avião ;)
beijos

Unknown disse...

Humm, muito bem sim senhora, não sabia dessa tua veia poética.
Pois é a nossa ilha é assim mesmo, ainda nem saimos e já temos saudades e vontade de voltar, mas em breve haverão mais brisas maracujá, broinhas, paredes para pintar e viagens ao "suá" hehe :)bjs e bom regresso à "vidinha".